terça-feira, fevereiro 27, 2007

Filha adoptiva da ex-companheira. Confusos?

Patricia Spado fue amante de Olive Watson, la hija del hombre que convirtió la compañía IBM en un gigante informático. Ocurrió hace quince años. En aquel tiempo no existían en Estados Unidos leyes de uniones homosexuales, así que Watson decidió adoptar a su compañera (quien entonces tenía 44 años, uno más que ella misma), para que quedara acogida a derechos tales como una pensión o una hipotética herencia. El vil metal ha desatado, una vez más, una controvertida batalla legal, según informa el diario The Times. [continue a ler o artigo do EL PAIS aqui]

As piruetas que um LGBT tem que fazer para contornar a falta de direitos em supostos Estados de Direito! As leis continuam a tornar-nos, por inerência, em freaks e aberrações, em tornar-nos cidadãos de segunda.

Em Portugal, não se vislumbra mesmo quando é que tal estado de coisas possa vir a alterar-se. As trabalhadas e a falta de coragem política começam mesmo na «juventude».

P. S. Já agora, vale a pena ler o ante-projecto de lei (em pdf) da dita Juventude que regula o casamento e que inclui o de pessoas do mesmo sexo, a apresentar quando deus nosso senhor quiser. Como grandes adivinhadores do sentir do «povo» parece que ainda não há consenso quanto à adopção de crianças por casais do mesmo sexo. Propõem assim, no que pensam certamente ser um grande avanço civilizacional, que no artigo 1974º nº3 «a adopção por pessoa casada [seja somente] admitida no caso de casamento entre pessoas de sexo diferente».

Melissa Etheridge



Um momento histórico nos Oscars 2007: o beijo e o discurso de Melissa Etheridge. De facto de lesbianest Oscars jamais realizado.

P.S. Parece que vou ter que estar a modificar constantemente o link do YouTube, já que a organização Oscars é implacável em reclamar os direitos de autor.

[Via Dos Manzanas]

segunda-feira, fevereiro 26, 2007

Confundir

Não sei se alguma vez conseguiram fazer o download da edição do dia do Público. Eu não. Deve ser alguma coisa do meu sistema operativo que o impede...

João Cândido da Silva, o responsável do, felizmente extinto, Dia D, suplemento do dito jornal e a bíblia neo-con do rectângulo, assinou hoje um texto, com o título «Discursos desasjustados», em cuja primeira parte mete ao barulho o «caso Gisberta».

O «discurso» não é novo. Patati patatá, descobrimos, em primeiro lugar, que o jornalista nem sabe o que é um/a transsexual. Continua a designá-la como «um» transsexual. Sugeria ao dito jornalista que consultasse a terminologia antes de dar rédea solta à pena. Não custa nada informar-se.

Depois, veio o eterno ódio a certas associações, gente ensemismada que não sabe o que faz e que «em vez da condenação de um comportamento displicente da justiça que afecta, de uma forma geral, toda a sociedade, fizeram um discurso centrado no seu pequeno universo de preocupações, acusando a justiça de que podem "matar-se transexuais, porque isso não tem em si consequência jurídica", conforme pôde ler-se no texto do Público que fez a reportagem do acontecimento. O problema grave, mas que parece não ter sido devidamente compreendido, é que, em Portugal, podem perpetuar-se homicídios impunemente, sendo a qualidade da vítima absolutamente indiferente. Infelizmente, o "caso Gisberta" é importante por não ser inédito e não pelo facto de a vítima ter sido quem foi».

Os Cândidos da Silva do país, vulgares em qualquer jornal de «referência» do rectângulo e numa miríades de blogues, pretendem confundir a opinião pública, através de correlações abusivas e de uma linguagem enganadora, de modo a imporem, como inevitável para o bem da nação, a sua agenda liberal-conservadora. O caldo homo e transfóbico ajuda imenso.

É verdade que o Estado gasta mais do que deve e gasta-o mal muitas vezes, portanto, segundo esta gente, é cortar a direito em tudo (ai o deficit!). A Justiça funciona pessimamente e o Processo Penal permite a impunidade, logo, segundo esta gente, não deve ser criada mais legislação para crimes de natureza fracturante (ai a burocracia!). Muitas associações são, de facto, obscuras, lesivas até do interesse geral, em consequência, para esta gente, não devem ser levadas em conta, para mais se, aos olhos do vulgo, de natureza egoísta e lasciva como as LGBT.

Pobre Gisberta, se sonhasse estar a ser instrumentalizada desta forma.

quinta-feira, fevereiro 22, 2007

A História enquanto obscenidade








A História é, como deveria constar em qualquer manual escolar, uma ciência, e, como qualquer outra, uma disciplina em constante evolução.

No entanto, não sendo contrariada, no seu todo, esta tese (já que a História é também estória), vendo «Os Grandes Portugueses», ficamos com a sensação de que em Portugal tal disciplina é apenas, e ainda, encarada como um objecto imutável. Gravada na pedra.

Trata-se, obviamente, da herança historiográfica romântica do século XIX, sublimada durante a ditadura fascista; herança que tende a enaltecer o «bom» e a esquecer o «mau», a omitir a heterogeneidade dos factos, homogeneizando uma sucessão de acontecimentos que parecem traçar um destino. Um grandioso destino.

E há nesta maneira de encarar o passado, uma certa obscenidade. O crime não interessa tanto como os actos louváveis. Essa maneira de usar (estamos no domínio da política) a História, encerra em si o negacionismo: recusa-se a reconhecer que, nos insterstícios do «grande desígnio», se podem esconder as maiores barbaridades. É, então, um objecto propangandístico. Foi-o durante o fascismo, assim como no século XIX, quando se começava a «forjar» a «identidade nacional».

Mas estamos no século XXI, por incrível que possa parecer. E é isso o que mais me entristece quando vejo programas como o proposto pela RTP, ou quando leio Rui Ramos no Público, seleccionando apenas aquilo que, do ponto de vista político, lhe interessava mostrar da história recente do país.

O programa de hoje, valeu sobretudo pelo contador da estória, um tal Gonçalo Cadilhe, surfista nos tempos livres, pelos vistos. Já que está inscrita na minha pele a promisquidade e a languidez (não é assim o corpo e a mente de um homossexual? que seja, portanto!), não tenho vergonha em afirmar que vi o programa até ao fim pelo lindo corpinho do apresentador.

Felizmente, a parte mais obscena foi já no final: uma suposta aproximação entre os povos, simbolizada por uns «espécimes» reunidos em roda e cujo principal impulsionador teria sido o glorioso Infante D. Henrique . Felizmente para Cadilhe, nenhum «espécime» se lembrou de dar um murro no estômago do apresentador. Aí sim, ter-se-ía concretizado uma boa metáfora e mostrado um pouco melhor do que foi, também, esse «encontro de povos». Mas isso seria, de facto, História.

quarta-feira, fevereiro 21, 2007

Carnaval

Somos verdadeiramente ridículos quando ignoramos a natureza ridícula de que somos feitos. O Carnaval é pobre quando comparado com o quotidiano.

Isto, enquanto me lembrava de uma passagem das «Confissões de uma Máscara» de Yukio Mishima. Aquela em que ele se recorda da tina de água em que foi lavado pela primeira vez.

segunda-feira, fevereiro 19, 2007

P, de poeira

O frisson do momento é comentar a cosmética do Público. A única coisa que me apraz dizer ao fim de uma semana é: porra, agora a XIS chama-se PÚBLICA?

É deixar assentar a poeira e veremos que o «novo» Público está, mais e mais, a cara do director. Neo-conismo, agora mais caro e a cores.

domingo, fevereiro 18, 2007

Repita comigo Professor, mas agora mais devagarinho...


















Nunca vejo tal coisa, mas hoje tive a infelicidade de estar perto de um écran de televisão e ver 2 minutos das alucinações de Marcelo. E nesses dois minutos ouvi qualquer coisa como: a lei tem que ser moderada [?], porque o PS já tem o eleitorado do BE e do PCP na mão e precisa de dar resposta ao «centro» que votou Sim no referendo.

Já todos sabíamos que, durante a campanha do referendo, o Professor pretendeu passar um atestado de burrice ao eleitorado deste país. Agora, e não sei se ele terá referido a sua derrota pessoal (é bem possível que tenha dito que até ganhou), pretende passar outro, referindo-se ao Sim Talvez que ele adivinha em muitos votantes do Sim: os do «centro».

A vontade do Professor, moderada diz, todos sabemos qual é; impôr o maior número de entraves à mulher, uma arregimentação tal da lei, que obrigue as mulheres a tomar a atitude que o Professor entende ser a única possível: obrigá-las a parir. Vamos ver até onde vai a sua batalha e os seus malabarismos.

Até lá é essencial dizer isto ao Professor. O eleitores, responderam Sim à seguinte pergunta: «Concorda com a despenalização da interrupção voluntária da gravidez, se realizada, por opção da mulher, nas 10 primeiras semanas, em estabelecimento de saúde legalmente autorizado?». Isto significa que quem votou Sim no referendo, pretende ver legalizada a prática da IVG até às 10 semanas de gestação, por vontade da mulher, num estabelecimento de saúde habilitado para o fazer. Responderam afirmativamente 59,25% dos votantes. É preciso repetir mais devagarinho ou também é necessário explicar ao Professor o que significa a palavra Democracia?

Agradecimentos

Queria agradecer ao André Benjamim, ao Heliocoptero, a José Bandeira e à Manel a linkagem ao diário remendado. O André passa, também, a constar da barrinha lateral.

sexta-feira, fevereiro 16, 2007

Não bastava sermos assassinos, senão também mutantes e pouco inteligentes















Paul Hill (na foto, à direita, em 1994) foi condenado à morte por ter assassinado dois médicos americanos numa clínica de IVG

A nota pastoral da CEP (Conferência Episcopal Portuguesa) em reacção aos resultados do referendo do passado domingo, com ampla difusão na VaticanTV, tem por título «O novo contexto da luta pela vida».

Entre outras pérolas ficámos a saber que o «resultado favorável ao “Sim” é sinal de uma acentuada mutação cultural no povo português» e que esse resultado se deve, entre outras causas, a «lacunas na formação da inteligência».

Dão vários recadinhos, claro, porque a Igreja não participou neste referendo, congratulando-se com a «
vasta e qualificada mobilização, verificada nas últimas semanas, em volta da defesa do carácter inviolável da vida humana e da dignidade da maternidade» e apelam para que «permaneça activa, que encontre a estrutura organizativa necessária, para continuar a participar neste debate de civilização». Como se depreende destas palavras é a palmadinha nas costas aos snipers que fizeram (e terão que continuar a fazer) o trabalho que a Igreja, oficial e evidentemente, não fez.

Mas há mais recadinhos: desta vez para os católicos que decidiram votar sim e o expuseram publicamente.
«Aos católicos que, no aceso deste debate, se afastaram da verdade revelada e da doutrina da Igreja, convidamo-los a examinarem, no silêncio e tranquilidade do seu íntimo, as exigências de fidelidade à Igreja a que pertencem e às verdades fundamentais da sua doutrina». Já sabem amigos católicos, analizem bem essas afirmações, feitas a quente, porque a verdade essa é só uma, a de Ratzinger, emanada, como se sabe, no frio das paredes infalíveis do Vaticano.

Os médicos também não são esquecidos: «
Apelamos aos médicos e profissionais de saúde para não hesitarem em recorrer ao estatuto de “objectores de consciência” que a Lei lhes garante». Aqui a CEP escusava de fazer este apelo. O Bastonário que têm já é suficiente para inculcar «a verdade» aos restantes colegas.

E finalmente o parágrafo dos parágrafos:
«A busca de uma solução, a médio e a longo prazo, tem de passar, também, por uma política de educação que forme para a liberdade, na responsabilidade, concretizada numa correcta educação da sexualidade. Esta constitui um dos dinamismos mais ricos e complexos do ser humano, onde se exprimem a dimensão relacional e a vocação para o amor e para a comunhão. Uma vivência desregrada da sexualidade é uma das principais causas das disfunções sociais e da infelicidade das pessoas. A sã educação da sexualidade há-de abrir para a gestão responsável da própria fecundidade, através de um planeamento familiar sadio, que respeite e integre as opções morais de cada um. Quando a geração de um filho não for fruto de irreflexão, mas de um acto responsável, estará resolvido, em grande parte, o problema do aborto». É desta que vemos, certamente, a ICAR nas ruas a reclamar a educação sexual nas escolas. A única e verdadeira: castidade, virgindade, proibição de anti-concepcionais e o coito interrompido.

Temo é que esta «luta» pela vida, da Igreja e dos seus snipers, possa vir a ter graves consequências. Nos EUA já teve e espero que cá em Portugal, a luta contra a «imoralidade» não chegue ao extremo, em si contraditório, de matar pela «vida». Mas o desespero que adveio desta derrota e da incapacidade de contornar um regime democrático, pode levar as consciências mais católicas a contrariar até o mais básico dos seus ensinamentos internos: «não matarás».

God is an asshowl!












Eu não tinha visto a última série de «Six Feet Under», em reposição agora na :2. It's so fucking beautiful!

Já agora, o título do post é a resposta de Ruth a um padre que tentava acalmá-la no velório do filho Nate.

Também eu, faz hoje três meses, tive vontade de dar aquela resposta. Infelizmente a minha vida não é tão boa como aquela série.

quinta-feira, fevereiro 15, 2007

Vem aí outro José Manuel Fernandes?

Parece que a direcção do Diário de Notícias foi demitida pelo proprietário do jornal, Joaquim Oliveira. Como o Luís, temo pelo futuro de pessoas que gosto muito, e que andam, ou não, pela blogosfera.

Mas mais do que isso, temo que o DN, que dava sinais de querer subtituir o Público como jornal de referência para a esquerda, venha a ser tomada por mais neo-cons e por mais do mesmo: o povo quer, nós damos. E essa dádiva, cheira-me, é mais gente sem interesse nenhum, de fraquíssima qualidade e que papagueia a cartilha neo-liberal e conservadora, que é o que vende em Portugal.

Contribuir com os meus impostos para subsidiar o negacionismo?








Ontem a RTP passou a «defesa» de diplomata Aristides de Sousa Mendes, nesse concurso (?) que dá pelo nome de «Grandes Portugueses». Desta vez o «defensor» foi José Miguel Júdice.

Havia que «defendê-lo» de alguma coisa? Aparentemente sim. Sobretudo, um dia depois de Jaime Nogueira Pinto ter afirmado, na «defesa» de Salazar, que este havia promovido a entrada de refugiados judeus por sua alta recriação e bondade. Claro, uma falsidade absoluta e que passou com a maior das canduras. Jaime Nogueira Pinto, só neste bocadinho, escarrou na memória de Sousa Mendes e de, pelo menos, 10 000 judeus que cá passaram nesse período. Tudo com o patrocínio da RTP.

A este propósito vale a pena atentar nas palavras de Ana Gomes, hoje no causa nossa:

A mim parece-me que não há nada que valorize mais a imagem de um país como a defesa de valores fundamentais e do funcionamento do Estado de Direito. No apuramento da verdade, doa a quem doer, dentro ou fora. Dentro e fora. E a Europa é dentro para nós, claramente.

É que não teríamos hoje democracia no nosso país se todos tivéssemos passado os 48 anos entre 1926 e 1974 a "valorizar e promover a imagem de Portugal a nível internacional" acriticamente, varrendo para debaixo do tapete os crimes do regime salazarista...cometidos em nome do bem-estar, da segurança e do bom nome de Portugal, convém lembrar.

E ainda de Filipe Castro, há uns dias, no Oeste Bravio:

Quando leio, oiço, ou vejo estas coisas, penso sempre se na Europa alguma vez alguém se ralaria com as pessoas que são ou foram torturadas.

Os americanos discutem estas coisas no Congresso e no Senado, metem-nas nos jornais e nos blogs. Os europeus parece que não gostam de perder tempo com estas minudências. Em Portugal, as notícias de espancamentos e assassínios nas esquadras da polícia, os abusos sexuais sobre prostitutas por polícias e juízes, o terrorismo organizado pelo governo contra a população civil basca, os crimes (horríveis!) da guerra colonial, nada disto gerou nenhuma espécie de má consciência, nenhuma reflexão, nenhuma consequência.

Em Espanha falou-se de tortura de prisioneiros bascos com alguma informalidade, em França publicaram-se livros sobre a tortura e o assassínio de prisioneiros políticos na Argélia sem que ninguém pestanejasse, soube-se dos ataques terroristas dos serviços secretos contra o Green Peace, por exemplo, e não houve consequências, os belgas preferem não falar sobre o Congo, os ingleses esqueceram-se completamente dos massacres de milhões de pessoas dos séculos XVIII e XIX na Índia, ou do massacre dos mau mau, ou da fome organizada na Irlanda, ou da guerra do ópio, e o mesmo se passa em Itália, na Polónia...

quarta-feira, fevereiro 14, 2007

Novas linkagens 2

Ontem foi dia de arrumação aqui no estaminé. Blogues desactivados para um lado, material XXX para outro, aglutinação espanhola, mais Media e sobretudo mais gente da blogosfera do rectângulo.

A saber: o extremamente hilariante a causa foi modificada, o vila-mataseano natureza do mal, as minhas histórias da Catarina, a solarenga praia do Ivan, blue is the favourite colour too, a pinhoada alcobacense, o damn queer da Anabela, doc log da Leonor, o esquerda republicana, the L and Anakin fish speaker world, os gatos que fedem, com o sandro e o ruca no irmão lúcia, o professor murcon e os canhotos.

Outros se juntarão certamente.

Não saias com qualquer uma?














Não fosse a consulta ao site da APF e ficaria aborrecido com esta iniciativa se só a conhecesse através desta notícia do DN. «Não saias com qualquer uma destas doenças» é o lema da campanha. Sem a parte final da frase, como noticiada pelo DN, como é que se poderia interpretar a frase? É melhor não adiantar muito, senão tenho o JPH a acusar-me de pidezinho.

Parabéns à APF pela iniciativa e, já agora, onde anda o pessoal do Não que tanto queria ajudar numa sexualidade responsável. Devem estar a estudar a melhor forma de dizer Assim Não, que isto de dar preservativos é liberalizar o sexo e tal...

terça-feira, fevereiro 13, 2007

Grandes lavagens de cérebro, ou a vingança dos filhos de Salazar

O que se está a passar com este programa da RTP é inqualificável. Assistimos hoje, passados 30 e quase 3 anos do 25 de abril, à reabilitação de uma personagem que só podia ser considerada detestável na história do país.

A RTP investiu em Jaime Nogueira Pinto a tarefa dessa autêntica lavagem de cérebro. Salazar foi pintado, exclusivamente, pelas suas virtudes de grande economista e nacionalista. Pôs as contas em ordem, fez crescer economicamente um país saído da ruína da «ditadura democrática» (assim descreveu Nogueira Pinto o período entre 1910 e 1926, termo que recusou usar para o «Estado Novo»), e «salvou» o país das catástrofes que foram a Guerra Civil Espanhola, a Segunda Guerra Mundial e dos comunistas. «Um grande português que pretendeu conservar a nação tal como a recebeu».

Os «males», considerados menores, da falta de liberdade, da prisão, da perseguição, da imensa pobreza, do atraso económico e cultural, foram menorizados ou até mesmo desmentidos. O grande desenvolvimento económico dos anos 60, por exemplo, pintados como se tal não tivesse surgido também, e diria que em grande parte, pela gigantesca máquina criada para satisfazer uma guerra absurda.

Como é tempo de defesa da católica alma, Nogueira Pinto não se coibiu, inclusivamente, de mostrar a humilde casinha onde nasceu o estadista e a singela campa do cemitério de Vimieiro onde repousa eternamente. «Não há quem olhe por isto, quem ponha as mãos aos céus e lhes dê a recuperação que tanto merecem?!», podia ler-se nas entrelinhas.

Vergonhoso programa que envergonha a estação pública e todos aqueles que, mesmo sem recorrer a José Mattoso, não necessitam de grande memória para perceber o que se passou esta noite: uma visão parcial sobre um homem que transformou Portugal numa imenso rebanho, num imenso curral da Europa, virado contra tudo e contra todos, levado pela loucura que imaginou, só como sempre esteve, ser a melhor para todos. Uma vã guarda que, para mal dos nossos pecados, e com o beneplácito da estação pública, parece querer ressuscitar.

segunda-feira, fevereiro 12, 2007

RTP ou o jornalismo hermenêutico




"Fragilizar a família é penalizar a sociedade", acrescentou Bento XVI, que nunca fez qualquer referência ao referendo em Portugal nem ao projecto sobre uniões de facto em Itália.

Título da notícia da RTP: «Bento XVI reage ao referendo».

Isto não é, de facto, um jornalismo sério, como de resto observámos durante a campanha que agora findou. O L'osservatore não faria melhor serviço à ICAR.


I said it before, Vicar, and i say it again: what that boy needs is a nice big cock up his ass!



Magnífica traila de série britânica Little Village. A homofobia é tão gay!

[via ambienteg]

Juízo da verdadeira causa do terramoto















Uma obra, cujo título é coincidente com o deste post, valeu ao Padre Malagrida a fogueira. Um outro Gabriel (magnífica coincidência, diga-se!) insinua algo de semelhante: um terramoto como castigo (divino?) por, maciçamente, o «povo do sul» ter escolhido o Sim (o pecado?).

Felizmente a ICAR já não comanda os destinos do país, senão era muito possível que o blasfemo comentador tivesse, nos próximos dias, que servir de rodízio a contento de um Deus, curiosamente, irado com as suas palavras.

Na taberna, com César das Neves

Igual a si próprio, João César das Neves, escreve que «esta é a sina do português, capaz de esquecer tudo por uma boa discussão de taberna, quanto mais abstracta melhor. Enquanto a vida passa e as crianças choram, logo na segunda-feira pela manhã».

De facto, a única coisa que suspeito que o «taliban da vida intra-uterina» deve ter feito ontem foi apanhar uma valente bebedeira. Só assim se explica o texto que publicou, obliterando tudo o que se passou nestas últimas semanas, inclusivamente o facto de ter sido dos que mais activamente participou no que agora designa como «discussão de taberna». Cada um com o Losantos que merece.

Dont' ask, don't tell


















Às 2 da manhã, está a passar na TVI o filme «A marcha de um soldado» (mais um incompreensível tradução de «Soldier's Girl», de Frank Pierson), sobre homossexualidade e transsexualidade no ambiente militar americano.

Pergunto-me, mesmo que esteja a passar às horas em que está, se os ares de Espanha já começaram a contagiar a TVI?

Vencedores e vencidos

Estou feliz. Muito feliz. Pelas mulheres em geral e um pouco por mim também. Concordo perfeitamente com a afirmação de que se se erradicar a misoginia também se erradica a homofobia. Na sua base ambos, misoginia e homofobia, têm uma causa comum: o machismo; essa ideia cavernícola de que há fortes e fracos por «natureza», sendo que ao primeiro grupo pertencem, «naturalmente», os homens e os heterossexuais e ao segundo, as mulheres e os homossexuais. Um pequeno instrumento, no sentido dessa erradicação, foi hoje conquistado.

Contudo, como já aqui tinha explicado, não creio que tenhamos aberto o caminho para a modernidade ou entrado no século XXI. Sem um país já modernizado, o expressivo resultado do Sim desta noite não teria sido possível. Contraria tudo o que, constantemente, os meios de comunicação e os comentadores da praça dizem de Portugal. A saber: que somos um país subdesenvolvido, económica e culturalmente, e de que não temos remédio. Esta noite, os Vascos e os Fernandes da nossa terra tiveram também o seu quinhão de derrota. Mesmo que tenham votado Sim.

Mas os grandes perdedores da noite foram outros. Foram, e aí concordo perfeitamente com o Miguel Abrantes, todos aqueles que queriam impôr a sua visão confessional do direito ao resto do país.

A ICAR portuguesa saiu gravemente prejudicada, pela sua participação directa e indirecta neste referendo. Nunca o tinha referido, mas cheguei a ter pena de todos os católicos que ao longo da campanha se manifestaram pelo Sim. Ser epitetados de assassinos pelos próprios correlegionários não deve ser fácil e mais, quando visto de fora, se pode pensar que não são, como afirmam, católicos. Ratzinger perdeu fiéis e esta luta política.

Outros grandes perdedores foram a generalidade dos meios de comunicação, com louváveis excepções, como o DN, que apesar de alguns dias Não, teve uma cobertura que se revelou equilibrada, ou o Público, apesar do seu Director.

As televisões, repetindo à exaustão, a linguagem demagógica e desonesta do Não («liberalização», «referendo ao aborto», etc.) estiveram péssimas e parciais. Sobretudo a RTP que até decidiu cortar o discurso de vitória dos movimentos do Sim, em detrimento de intermináveis minutos de palmas na sede dos derrotados.

A SIC passou desesperadamente peças sobre «os milagres» da reprodução medicamente assitida. Desenterrou, imagine-se, a história de um paraplégico que não conseguia ejacular. Pior, não lhes podia ter saído o tiro.

Nem comento a cobertura de jornais como o Correio da Manhã, esse pasquim de mortes e de padres, que na sexta-feira conseguiu a proeza de ocultar o resultado de uma sondagem que dava a vitória ao Sim, e que ontem mesmo, publicava uma entrevista ao famoso proselitista das manhãs da RTP de seu nome Padre Borga. Da Rádio Renascença, tenho dito.

Mas o maiores perdedores da noite foram Marcelo Rebelo de Sousa e António Guterres, os responsáveis pelo imbróglio que foi todo este tema. Mandaram para a esfera referendária, por clara tacticidade, algo que a Assembleia da Rebública tinha toda a legitimidade para resolver. Previam que esta situação e a vitória sistemática do Não, acabasse por cansar o eleitorado e manter indefinidamente esta situação. Também lhes saiu o tiro ao lado. Em dez anos Portugal adiantou-se, por incrível que pareça, à sua vizinha Espanha. A hipocrisia e o direito canónico sairam, ainda que em parte, do Código Penal Português.

Ao contrário da generalidade dos comentadores, eu acredito que a esquerda ganhou este referendo, e com ele os partidos que sempre se bateram pela despenalização, mesmo com um PS titubiante em 1998 e, agora, com deputadas que mereciam estar na bancada do CDS-PP. Assim sendo, creio que foi uma vitória de José Socrates. Marques Mendes e a campanha desonesta que conduziu, perdeu em toda a linha. Vai continuar a perder influência dentro do partido. O CDS-PP está reduzido a uma insignificância que não tem paralelo com o número de comentadores que tem na esfera pública e nos centros de decisão.

Para finalizar, gostaria de dar os parabéns a todos os que conduziram o Sim. Uma imensidade de blogues lutou por isso e saliento sobretudo, porque foram os que mais segui, o sim referendo, o renaseveados, o câmara corporativa, o causa nossa, do qual não posso deixar de deixar uma palavra de apreço por Vital Moreira, apesar de lhe ter, de vez em quando, uma certa alergia, ou o glória fácil. O Sim deve muito a Fernanda Câncio.

Termino como comecei. Estou feliz. Muito Feliz. Sobretudo porque foi a primeira vez que o meu voto esteve do lado de quem ganhou umas eleições neste país.

domingo, fevereiro 11, 2007

Desonestidade e manipulação, do princípio ao fim

Apesar dos resultados desfavoráveis aos activistas do "não", caso se confirmem as projecções, Isilda Pegado defende que a lei deverá continuar como está e deverá ser inviabilizada a proposta de despenalização da Interrupção Voluntária da Gravidez (IVG) até às dez semanas proposta hoje ao eleitorado.

Era este o raciocínio que se ouvia por parte do adeptos do Não mesmo depois de serem conhecidos os resultados finais.

Isto não é sério! A manipulação do resultado da abstenção em benefício próprio é coisa que nunca se tinha assistido desde que há democracia em Portugal. Quem não votou, parece óbvio mas tem que ser repetido, não expressou qualquer opinião, salvo, quanto muito, que o tema não interessava, sem que daí se possa inferir mais nada.

Não é com declarações destas, ou outras a roçar a demência, que vão alterar o que quer que seja do que se passou hoje. Manipular actos eleitorais em causa própria tem cabimento num regime político que, felizmente, já acabou.

Os resultados

Segundo o STAPE, à pergunta «Concorda com a despenalização da interrupção voluntária da gravidez, se realizada, por opção da mulher, nas 10 primeiras semanas, em estabelecimento de saúde legalmente autorizado?», os eleitores responderam:

Sim: 59, 25% (48,70%, em 1998)
Não: 40,75% (51,30%, em 1998)
Diferença de votos: 18,50% a favor do Sim (2,6% a favor do Não, em 1998)

Votaram: 43,61% (31,91%, em 1998)
Abstiveram-se: 56,39% (68,09%, em 1998)

Resultados extremos:
Sim, obteve um máximo de 83,90% no distrito de Beja (78,17%, em 1998)
Não, obteve um máximo de 69,05% na Região Autónoma dos Açores (82,66%, em 1998)
Salvo erro, o concelho onde o Sim obteve o maior resultado foi em Aljustrel, distrito de Beja, com 90,41% (83,57%, em 1998)
Salvo erro, o concelho onde o Não obteve o maior resultado foi em Câmara de Lobos, Região Autónoma da Madeira, com 84,15% (91,12%, em 1998)

Resultados no distrito de Faro (minha área de residência)
Sim: 73,64% (69,59%, em 1998)
Não: 26,36% (30,41%, em 1998)

- Votaram neste referendo 3 851 613 de eleitores, mais 1 208 924 eleitores do que em 1998, o que encurtou a abstenção em 11,7% face a 1998; mesmo assim a abstenção teve um valor superior a 50%, o que invalidou, como em 1998, o vínculo obrigatório do acto referendário.

- 698 975, foi a diferença real, a favor do Sim, neste referendo, tendo sido de 67 502 em 1998, na altura a favor do Não. O primeiro valor é cerca de 10 vezes maior que o último.

- Salvo algum caso que me tenha passado, em nenhum distrito ou concelho do país a votação no Sim baixou em relação a 1998.

sexta-feira, fevereiro 09, 2007

Uma imagem, por mil palavras


















Crucifiction (Gluttony), Biljana Djurdjevic (2004)

Da modernidade

Num último apelo ao voto, José Sócrates referiu «que a escolha no referendo de domingo sobre a despenalização do aborto é "entre a mudança e a modernidade", com o voto no "sim", e o conservadorismo, através do voto no "não"». Não podia estar mais de acordo com tal afirmação.

Contudo, não posso deixar de salientar que o que vamos saber no domingo não é tanto saber se o país quer abraçar a modernidade mas se já a abraçou.

O voto no Sim é um voto difícil. Difícil porque é, acima de tudo, um voto reflectido, ao contrário de um voto Não, que se baseia sobretudo na emoção.

Votar Sim, pressupõe que se percebeu uma pergunta: concorda com a despenalização da IVG até às 10 semanas de gravidez, por opção da mulher e em estabelecimento de saúde legalmente autorizado. Despenalização não é, portanto, liberalização do que quer que seja.

Votar Sim, pressupõe que se entende correctamente o que é um referendo. À pergunta formulada só se pode responder Sim ou Não. Mais: à resposta maioritária corresponde uma, e só uma, resposta legislativa. Ou o Sim ganha e a Assembleia da República tem a obrigação de legislar e regulamentar em prol da despenalização, ou o Não ganha e tudo permanece como está, continuando a figurar no Código Penal português a pena de prisão para quem fizer interromper uma gravidez, com excepção dos casos já previstos.

Votar Sim, pressupõe perceber como funciona e para que serve um Código Penal. E não serve, definitivamente, para impôr a todos uma moral em que apenas uma parte da população se revê.

Votar Sim, pressupõe reconhecer que um problema existe e que se deve tentar resolvê-lo da forma mais sensata possível. Criando o quadro legal que permite percebê-lo (e o que é clandestino não é conhecível), e tentando sanar as razões pelas quais ele acontece. Fomentando, a montante, uma educação sexual efectiva, e a juzante, tentando dar à mulher um máximo de possibilidades, em que a interrupção é só uma última, contudo legítima, possibilidade.

Votar Sim, é também reconhecer à mulher a capacidade de decidir por si sobre o que é melhor para a sua vida. É reconhecer-lhe inteligência e discernimento. É respeitá-la.

Por tudo isto, se o Sim vencer no próximo domingo, reconcilio-me com este país. Não está a caminho da modernidade, já é moderno. Se o Não vencer, não é nem moderno, nem estará a caminho de qualquer sentido de modernidade. Continuará somente na vã guarda.

José Manuel Fernandes inventa nova pergunta para o referendo

Quando pensamos que mais surpresas não podem vir, eis que José Manuel Fernandes, director do Público, volta a surpreender. Não é que os portugueses, afinal, vão votar «para decidir se aprovam ou não a liberalização do aborto, a pedido da mulher, até às dez semanas de gravidez»?

E ainda se gaba, no mesmo editorial (o de hoje), de que o Público foi «de longe o jornal que mais e melhor se abriu à troca de argumentos e onde foram publicados os principais textos de referências de ambos os lados».

Até pode ter sido, mas um pouco de humildade não fica mal a ninguém e, sobretudo, gabar-se disso e escrever uma introdução que parecia tirada de um dos lados em contenda só contraria tão retumbante parangona.

A maioridade












Systematic Examination, Biljana Djurdjevic (2005)

As últimas sondagens dão ao Sim 58, 54 ou 53% das intenções de voto, bastante vagas, suponho, sobre o que esperar dos verdadeiros resultados. Tanto mais que a abstenção pode superar os 50% e tornar, outra vez, o resultado não vinculativo ou sem força.

Poucas coisas me motivam mais do que o que esteve em causa neste referendo. Apesar de, no fundo, achar que o que se discutiu foi, em si, uma coisa inaceitável numa sociedade que se diz moderna: discutir a mulher, o seu corpo (e nele incluo tudo o que não é físico); esventrar um mundo que só a ela diz respeito. Uma devassidão, portanto. Um ter que discutir, em pleno século XXI, se a mulher é uma coisa ou um ser humano (Homem, como qualquer outro), capaz de tomar decisões sem a ajuda do lado masculino do planeta, lado esse representado e consagrado nas leis de um país.

Mas dizia que poucas coisas me motivam mais. A de lutar pelo direitos das minorias, sendo a mulher uma estranha minoria, já que compõe mais de metade do país. Mas o Bandeira é que tinha razão: a misoginia é cada vez menos uma prerrogativa masculina. Não acho estranho até, sabendo, por exemplo, que entre os homossexuais poucos estariam dispostos a ter uma posição favorável à sua emancipação (seja qual for o tema). O status quo interessa tanto aos carrascos, como às vítimas: vive-se o drama que se conhece.

Queria, no entanto, deixar uma palavra às pessoas que por aqui passem e que tenham a paciência de me ler: abstendo-se ou votando Não no próximo domingo, estão a perpetuar tudo, tal qual está. Não vai existir esse Não que é Sim. Ganhando o Sim, o campo de batalha passa a ser exclusivo de cada mulher perante a sua própria realidade. Deixe-a obter a maioridade.

quinta-feira, fevereiro 08, 2007

As cruzes e os credos










Um novo símbolo para o STAPE, a contento do CDS-PP.

quarta-feira, fevereiro 07, 2007

Do sentimentalismo à frivolidade, da "criança" com dez semanas ao mercado negro

O argumentário do Não é, como se sabe, muito variado. Tanto, que estou em crer que há gente que vê comunistas a comer criancinhas na pergunta do referendo.

A campanha do Não tem sido feita com o recurso às mais abjectas formas de persuasão, como o recurso a imagens de fetos ou de utilização despudorada de crianças (pretendendo com elas explorar o mais primário sentimentalismo) até aos argumentos mais frívolos, como o de que o Estado, e os portugueses, vão pagar literalmente pelos erros (crimes/devassidões, claro está) dos outros (explorando o clima de insegurança económica que o país atravessa).

E é nesta última estirpe de argumentos que eu encontro mais graça, sobretudo se vêm de um ex-ministro da finanças. Bagão Félix vem dizer, por exemplo, que está em desacordo que seja o Estado a pagar as despesas de uma licença por IVG (contemplada, actualmente, no actual Código do Trabalho com 14 ou 30 dias, consoante a interrupção tenha sido espontânea ou terapêutica).

Eu até compreendo que Bagão Félix esteja contra os direitos dos trabalhadores deste país. Enquanto ministro das finanças, só não tirou mais porque não era o CDS-PP que estava em maioria na coligação. Mas daí a abdicar das regras, boas ou más (eu não sei onde esta gente vai buscar tanta imaginação, para falar de uma regulamentação que ainda não está concretizada), para fazer a apologia do mercado negro ou da fuga de dividendos para o estrangeiro (com sede em Espanha ou Inglaterra) .

A IVG clandestina, quer estas cabeças queiram quer não, é uma realidade neste país, e vai continuar a sê-lo. Um gigantesco mercado paralelo que, perdoem-me a frivolidade, tem uma taxa altíssima de produtividade - poucos meios para exercer a actividade e muitos lucros - e que manda a Direcção-Geral de Contribuições e Impostos às urtigas.

Bem trabalhadinho, senhor ex-ministro, o Estado ainda pode vir a lucrar com a IVG legalizada. Veja só o dinheirinho que cá não fica de quem habitualmente vai ao estrangeiro e pode, com toda a facilidade, prescindir do SNS e deslocar-se às filiais portuguesas da clínica "Los Arcos". É só mais um pouco de imaginação senhor ex-ministro.

terça-feira, fevereiro 06, 2007

Dois nascimentos



O autor deste blogue está de grande. Hoje, nasceu este rebento. Faz amanhã um ano, este.

História de um imbróglio

José Medeiros Ferreira assina hoje um artigo no DN sintetizador da história da legislação sobre a IVG em Portugal. Um imbróglio que, desde a legislação de 1984, não tem resolvido nenhum problema essencial da questão e que tem sido sucessivamente boicotada por sectores católicos dentro e fora da Assembleia da República.

Como muito bem disse Nuno Brederode Santos, antes de ser um problema de consciência, a IVG é um problema de política criminal e, acrescentaria eu, cuja resolução é eminentemente ideológica.

Ou se aceita que o papel das mulheres se resume à sua função reprodutiva e que o Estado as dever criminalizar e penalizar por atentado contra essa função essencial; e estamos, pois, dentro de um quadro ideológico de direita, que é o que tem vigorado até hoje.

Ou se aceita que o papel das mulheres está para além dessa função e que o Estado não tem direito a interferir na sua intimidade, despenalizando-a e descriminalizando-a por se socorrer da IVG. Estamos evidentemente dentro de um quadro ideológico de esquerda, por muito que os novos liberais de direita (e já agora de esquerda) o neguem por uma questão de pragmatismo perante a mesa de voto: nunca a direita mexeria uma palha, nem pela despenalização da mulher, nem pelo planeamento familiar, nem qualquer outra iniciativa que valorizasse o papel da mulher, que não fosse por arrasto das propostas da esquerda e pelo conhecimento, cada vez mais aprofundado, dessa triste realidade que dá pelo nome de IVG clandestina.

Folgo em saber é que parte da nova direita, já atribui um papel diferente à mulher. E ainda bem que se juntaram à causa do Sim. Julgo até que, se o Não voltar a ganhar, pela abstenção ou pelos votos expressos, mais e mais gente futuramente se lhe juntará.

Estranho, estranho, será mesmo se no dia 11 vence novamente o Não, já que está representado na Assembleia da República por cerca de 1/3 dos deputados, e é defendido por um partido da extrema-direita nazi e por uma confissão religiosa e seus apêndices.

Em desespero de causa tudo vale

Ficou mais uma vez claro que os «pró-prisão» tem um entendimento das leis e das regras democráticas muito restricto. Aquele que naturalmente salvaguarda para todos o que é a posição moral de uma minoria.

A poucos dias do referendo «atiram» mais uma proposta absurda, sob todos os pontos de vista (que demonstra, inclusivamente, uma total ignorância do funcionamento do Código Penal Português), e que, para mais, «abusa do sentido democrático do referendo», como referiu ontem o constitucionalista Vital Moreira.

A pergunta, que passou por todos os trâmites legalmente impostos para ser colocada em referendo nacional, é clara e, claro, constitucional: quem é a favor da despenalização da IVG, até às 10 semanas, por opção da mulher, em estabelecimento de saúde legalmente autorizado vota Sim; quem é contra a despenalização vota Não; consequentemente, quem quer mudar a lei actual vota Sim, quem quer manter a lei actual vota Não.

Qualquer outra interpretação, para fins legislativos, que sair deste referendo é abusiva e fere o instituto democrático em questão (o referendo) e a inteligência de qualquer cidadão deste país. Seria como um partido ter ganho a maioria parlamentar e ser a oposição minoritária a assumir o governo (isto ferindo outro instituto democrático).

Podem até querer desorientar a opinião pública, mas os movimentos do Não escusavam de, em desespero de causa, demonstrar a maior ignorância e desrespeito pelas regras democráticas em vigor deste país.

P. S. Já agora, alguém me explica se Manuel Antunes, um dos defensores do Não no debate desta noite, é irmão gémeo de César das Neves? Não é pelo mais que semelhante talibanismo, é mesmo pela semelhança física.

segunda-feira, fevereiro 05, 2007

Post à Helena Matos ou quando se espera que o problema se adeque à solução

Como se sabe, quem vive da miséria e da desgraça alheias, não quer acabar com elas. É uma questão de sobrevivência. Combater a juzante, e da única forma que se acha moralmente aceitável, é uma maneira de não querer acabar ou minorar o problema. Sendo que é de IVG que estamos a falar.

Com o apoio da lei, que não querem ver modificada porque se encarrega de dar razão à sua "moral"; com o apoio, incusivé, dos dinheiros do Estado, a ICAR e uma miríade parasitária de instituições e associações a ela afectas, vivem precisamente deste esquema. Acabando com o "mal", a sua "caridade" e a sua "bondade" (entendidas de uma maneira muito estricta) não farão mais qualquer sentido.

Com uma vitória do Sim no próximo domingo, esse estado de coisas alterar-se-ia substancialmente. Tal como o PCP, que pretende que a realidade se adeque às suas soluções - não raras vezes, vemos propostas comunistas contra toda e qualquer ideia que melhor a vida das pessoas, desde que essas ideias estejam contra a sua ortodoxia ideológica - também os «pró-prisão» lutarão contra uma realidade que, esperemos, se afastará cada vez mais do que tem sido. Um pasto incrivelmente fértil de miséria, drama, misoginia e mesmo de morte. De mulheres, claro.

É pela sobrevivência e pelo poder que lutam os partidários do Não.

José Pacheco Pereira e a poligamia

Que credibilidade tem José Pacheco Pereira (JPP) para refutar estes argumentos de Sarsfield Cabral? Que me lembre foi precisamente JPP que o usou o tema para refutar o casamento entre pessoas do mesmo sexo (PMS) há um ano e a propósito do caso Teresa e Lena.

As semelhanças retóricas entre o que veio defender o colunista do DN e JPP, há um ano, são muitas, principalmente porque mentirosas e desonestas. Com uma diferença. Sarsfiled Cabral é conservador e católico e JPP um suposto libertário, que defende, quando lhe interessa claro, que ao Estado não cabe ter uma posição moral sobre a intimidade das pessoas. Foi ver, desde então, a cruzada anti-moralizante do Estado de JPP contra a instituição casamento, em todas as suas formas: hetero, homo, poligâmica, etc!

Não estou a ver coerência em JPP, coerência essa que tanto estima, por exemplo, no conservadorismo cavernícola da ICAR e de Joseph Ratzinger. Amanhã a poligamia talvez seja porreira para descredibilizar a discussão de um tema em que JPP não tenha interesse e em que esteja em causa apenas o seu umbigo e os seus preconceitos.

domingo, fevereiro 04, 2007

Os mortos falam?














Cena do filme «Salò, ou os 120 dias de Sodoma» de Pier Paolo Pasolini (1975)

Quando não há argumentos, todo o género de manipulações serve. E o Não não tem feito outra coisa nesta campanha. Nem um único argumento sério. Nada que não seja um rol de insinuações misóginas, de utilização desavergonhada de crianças e de imagens de fetos, de desinformação sobre todo e qualquer dado estatístico, de desacreditação da pergunta que é colocada em referendo, de utilização de um léxico sentimental e/ou falso como «criança» em vez de «embrião»/«feto», ou «liberalização» em vez de «despenalização».

Mas, para além da ICAR, ainda não tinha assistido nesta campanha à utilização/manipulação da opinião expressa por gente há muito desaparecida. Não será Jesus Cristo, por exemplo, o morto cujas palavras e actos mais foram manipulados ao longo da história moderna da humanidade?

Gonçalo Reis, administrador da RTP (será coincidência?), assinou este sábado um artigo de opinião no Público (indisponível on-line) em que se socorria da opinião de Pier Paolo Pasolini (assassinado nos anos 70, muito possivelmente pelas suas opiniões), e, pelos vistos, acérrimo defensor da vida intra-uterina.

Será lícito trazer para a contemporaneidade, as opiniões de um multidisciplinar artista italiano cuja opinião ficou enclausurada num mundo, por exemplo, onde ainda existia o muro de Berlim e onde se sentia um clima de abertura no Vaticano, silenciado posteriormente por João Paulo II e Bento XVI? Vivesse hoje e teria a mesma opinião de há 30 anos, sobretudo se tivesse sobrevivido a um atentado cujo principal objectivo era silenciar a sua opinião?

Enfim... Testemunho estéril trazido para o debate para dar a impressão de que ser vanguardista e de esquerda, como Pasolini, também é ser «pró-prisão». Morto pode-se ser tudo, de facto.

Novas linkagens 1

Queria agradecer a José Teófilo Duarte, do blogoperatório, e à Sandra, do blog remendado, a referência e as palavras amáveis dirigidas ao diário remendado e ao seu proprietário.

Já agora Sandra, quem plagia um plageador não merece reprovação. Aliás, se Luiz Pacheco soubesse disto certamente diria para nos deixarmos de merdas. Um elogio, portanto. Recíproco.

quinta-feira, fevereiro 01, 2007

A imparcialidade, segundo o Bastonário da Ordem dos Médicos

O cinismo não é um exclusivo da campanha da ICAR.

Ainda hoje, no programa «Sociedade Civil» da 2:, (ou)via o Bastonário da Ordem dos Médicos dizer que a mesma não está em campanha e não tem opinião oficial sobre o assunto.

Contudo, não se poupou a comentários como «é lamentável que o Estado financie abortos em clínicas privadas quando já não há, a meio do ano, contraceptivos disponíveis no SNS» ou «a vida, depois dela começar, não é disponível». A RTP ajudou ao regabofe, colocando imagens de fetos com largos meses em pano de fundo. Pode, de resto, ser revisto aqui (o depoimento vem a partir do minuto 28).

SIMrviço público

Dois debates essenciais. Entre Fernanda Câncio e Laurinda Alves e Daniel Oliveira e João César das Neves. Não por acaso, a Fernanda e o Daniel estão na blogosfera. Ter argumentos, e expô-los, não é para todos, muito menos para talibans.

[Via Miguel Abrantes]

Quem? Nós?!

O Padre Lino Maia, da Confederação Nacional de Instituições de Solidariedade, afirmou desconhecer a "Carta à minha mãe" entregue a várias crianças que frequentam dois infantários em Setúbal, dirigidos pelo Centro Paroquial da Anunciada, IPSS comparticipada pelo Estado. «Trata[-se] de uma acção localizada», frisou. «O nosso discurso desde Novembro é de grande abertura às várias opções».

Caso após caso, a estratégia cínica da não-oficializada campanha pró-prisão da ICAR vai singrando. Onde pode, interfere. Onde pode, usa do erário público para os seus objectivos. Onde pode, usa as formas mais sujas de campanha. Isto sem nunca ser responsabilizada ou responsabilizável. E ainda se queixam de falta de isenção dos órgãos de comunicação social! É muita falta de vergonha.