Não bastava sermos assassinos, senão também mutantes e pouco inteligentes
Paul Hill (na foto, à direita, em 1994) foi condenado à morte por ter assassinado dois médicos americanos numa clínica de IVG
A nota pastoral da CEP (Conferência Episcopal Portuguesa) em reacção aos resultados do referendo do passado domingo, com ampla difusão na VaticanTV, tem por título «O novo contexto da luta pela vida».
Entre outras pérolas ficámos a saber que o «resultado favorável ao “Sim” é sinal de uma acentuada mutação cultural no povo português» e que esse resultado se deve, entre outras causas, a «lacunas na formação da inteligência».
Dão vários recadinhos, claro, porque a Igreja não participou neste referendo, congratulando-se com a «vasta e qualificada mobilização, verificada nas últimas semanas, em volta da defesa do carácter inviolável da vida humana e da dignidade da maternidade» e apelam para que «permaneça activa, que encontre a estrutura organizativa necessária, para continuar a participar neste debate de civilização». Como se depreende destas palavras é a palmadinha nas costas aos snipers que fizeram (e terão que continuar a fazer) o trabalho que a Igreja, oficial e evidentemente, não fez.
Mas há mais recadinhos: desta vez para os católicos que decidiram votar sim e o expuseram publicamente. «Aos católicos que, no aceso deste debate, se afastaram da verdade revelada e da doutrina da Igreja, convidamo-los a examinarem, no silêncio e tranquilidade do seu íntimo, as exigências de fidelidade à Igreja a que pertencem e às verdades fundamentais da sua doutrina». Já sabem amigos católicos, analizem bem essas afirmações, feitas a quente, porque a verdade essa é só uma, a de Ratzinger, emanada, como se sabe, no frio das paredes infalíveis do Vaticano.
Os médicos também não são esquecidos: «Apelamos aos médicos e profissionais de saúde para não hesitarem em recorrer ao estatuto de “objectores de consciência” que a Lei lhes garante». Aqui a CEP escusava de fazer este apelo. O Bastonário que têm já é suficiente para inculcar «a verdade» aos restantes colegas.
E finalmente o parágrafo dos parágrafos: «A busca de uma solução, a médio e a longo prazo, tem de passar, também, por uma política de educação que forme para a liberdade, na responsabilidade, concretizada numa correcta educação da sexualidade. Esta constitui um dos dinamismos mais ricos e complexos do ser humano, onde se exprimem a dimensão relacional e a vocação para o amor e para a comunhão. Uma vivência desregrada da sexualidade é uma das principais causas das disfunções sociais e da infelicidade das pessoas. A sã educação da sexualidade há-de abrir para a gestão responsável da própria fecundidade, através de um planeamento familiar sadio, que respeite e integre as opções morais de cada um. Quando a geração de um filho não for fruto de irreflexão, mas de um acto responsável, estará resolvido, em grande parte, o problema do aborto». É desta que vemos, certamente, a ICAR nas ruas a reclamar a educação sexual nas escolas. A única e verdadeira: castidade, virgindade, proibição de anti-concepcionais e o coito interrompido.
Temo é que esta «luta» pela vida, da Igreja e dos seus snipers, possa vir a ter graves consequências. Nos EUA já teve e espero que cá em Portugal, a luta contra a «imoralidade» não chegue ao extremo, em si contraditório, de matar pela «vida». Mas o desespero que adveio desta derrota e da incapacidade de contornar um regime democrático, pode levar as consciências mais católicas a contrariar até o mais básico dos seus ensinamentos internos: «não matarás».
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